Julio Gonçalves

Inteligência Artificial e Psicologia (resumo do episódio do @eslenpodcast)

Vamos falar de Inteligência Artificial (IA) e Psicologia?

Este conteúdo propõe abordar os aspectos históricos, teóricos e práticos da Inteligência Artificial na Psicologia, contextualizando-os em forma de resumo expandido a partir do episódio que participei do podcast do Eslen Delanogare.

1 ALINHAMENTO CONCEITUAL E HISTÓRICO

Em 1943, um marco crucial foi estabelecido no campo da IA quando alguns McCulloch e Pitts publicaram um artigo pioneiro sobre redes neurais profundas. Este trabalho, fundamentado em estudos cognitivos, moldou a visão de como nossa compreensão dos processos cognitivos poderia servir de modelo para o desenvolvimento de máquinas capazes de programar e se comportar como seres humanos.

Outro marco importante, na década de 1950, ocorreu com Alan Turing contribuindo significativamente para o campo. Para quem não conhece o Turing, precisa assistir o filme “O jogo da imitação”, que conta a história dele.

Turing, conhecido por seu papel na Segunda Guerra Mundial como líder do projeto “The Bombe”para decifrar códigos alemães, publicou um artigo sobre máquinas pensantes. Outra contribuição importante é o famoso “Teste Turing”, uma abordagem concebida para avaliar a capacidade de uma máquina de exibir comportamento indistinguível do humano.

O ano de 1956 foi emblemático para a IA, marcado por uma conferência de oito semanas em Dartmouth, que fundou o programa Dartmouth Summer Research  Project  on  Artificial  Intelligence (DSRPAI). Este evento pioneiro reuniu filósofos, matemáticos, psicólogos e programadores. Foi nesse evento que o termo “Inteligência Artificial” foi cunhado por John McCarthy, conferindo uma identidade formal ao campo (nomezinho marketeiro, hem?).

O impulso gerado pela conferência foi ainda mais fortalecido pela presença da Fundação Rockefeller, que optou por financiar pesquisas futuras nesse domínio emergente. 

Em 1959, Arthur Samuel, com seu programa “Game of Checkers”, protagonizou um marco significativo ao desenvolver possivelmente o primeiro programa de autoaprendizagem do mundo. Esse feito representou a primeira demonstração concreta do conceito fundamental da IA. O programa de xadrez não apenas jogava, mas também aprendia com seus erros, marcando um avanço notável na capacidade das máquinas de assimilar informações, adaptar estratégias e aprimorar suas habilidades ao longo do tempo.

A iniciativa de Samuel lançou as bases para uma abordagem mais dinâmica e adaptativa na concepção de sistemas de IA, inaugurando a era de máquinas que não apenas executavam tarefas, mas também tinham a capacidade intrínseca de melhorar seu desempenho com base na experiência

Esses anos, abrangendo de 1943 a 1959, podem ser considerados um período de “primavera” no campo da IA, caracterizado por um florescimento na pesquisa e desenvolvimento. À medida que conceitos fundamentais eram estabelecidos, a IA começava a desabrochar como uma disciplina independente, trazendo consigo promessas para o futuro da tecnologia e da compreensão da inteligência computacional.

Ainda em 1959, viu-se o desenvolvimento de um General Problem Solver (GPS) que alcançou reconhecimento ao receber o Prêmio Nobel. Esse sistema destacou-se por sua capacidade de abordar problemas matemáticos e jogos desafiadores, como a Torre de Hanói.

Na década de 60, mais precisamente em 1967, testemunhamos a construção do chatbot chamado Eliza, cuja intenção era imitar uma psicanalista (sério, gente, logo psicanalista!)

Este foi um dos primeiros chatbots conversacionais, caracterizado por uma programação simples (mas para a época, surpreendente) baseada em regras de “SE-ENTÃO”. Em termos de interação, o que Eliza faz é pesquisar por palavras- chave relevantes no texto enviado pelo usuário, e a partir daí evocar uma resposta pré- programada a partir de seu banco de dados. O site para interação com Eliza está ativo e pode ser acessado pelo link https://www.masswerk.at/elizabot/.

Em 1974, o sistema MYCIN, fruto da tese de doutoramento de Edward Shortliffe, foi desenvolvido para identificar as bactérias causadoras de infecções graves, tais como bacteremia e meningite, e para recomendar antibióticos, com a dose ajustada para o peso corporal do paciente.

O MYCIN, apesar de seu desempenho superior nos testes em relação aos membros do corpo docente da escola médica de Stanford, nunca foi implementado na prática. Essa lacuna não decorreu de falhas em sua eficácia, mas sim de questões éticas e legais que surgiram em torno do uso de computadores na medicina. O dilema central residia na responsabilidade: em caso de diagnóstico incorreto ou recomendação terapêutica inadequada, quem deveria ser responsabilizado?

Nesse período, um psicólogo cognitivo proeminente, Marvin Lee Minsky, um dos fundadores do Dartmouth Summer Research  Project  on  Artificial  Intelligence (DSRPAI), comenta de um período estimado entre 3 a 8 anos, para alcançar a tão almejada inteligência geral de uma máquina (aqui ele errou feio!)

O problema desse comentário foi a geração de expectativa nas instituições financiadores e nos governos, o que pode ter auxiliado na tomada de decisão de parar com os investimentos nas pesquisas de IA, como vemos a seguir. Até então, o foco predominante estava na IA estreita, focada em resolução de problemas bem demarcados. 

Essa fase, abrangendo as décadas de 60 e 70, marcada pelos anos de 1967 e 1974, pode ser considerada um “verão” na evolução da IA, caracterizada por notáveis avanços na pesquisa e no desenvolvimento de sistemas inteligentes, especialmente na área da saúde.

É relevante destacar que, em comparação com a teoria avançada no artigo de 1943 sobre redes neurais profundas, os algoritmos empregados na prática na época eram consideravelmente inferiores. Esta disparidade reflete a dificuldade em traduzir avanços teóricos em aplicações práticas devido à limitação do poder computacional. A falta de máquinas suficientemente poderosas em termos de processamento impediu a execução de cálculos mais robustos e complexos, atuando como um entrave significativo para o progresso mais rápido da IA nesse período.

Agora, chegamos ao “inverno” da IA. A partir de meados de 70 em diante, o governo britânico, preocupado com a demora no desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias, emitiu relatórios destacando os obstáculos e a dificuldade de traduzir o comportamento humano para máquinas. 

Como resultado, reduziu o financiamento, uma decisão seguida pelos Estados Unidos, iniciando assim um período escasso em termos de pesquisa e desenvolvimento de IA, com poucas manifestações nos anos seguintes.

Somente em 2010 observamos um retorno significativo, se mantendo até então (além de se manter, está sendo exponencial). Em resumo, as manifestações mais notáveis até esse momento incluem:

  • 1986: O algoritmo de backpropagation, desenvolvido por Geoffrey Hinton, David Rumelhart e Ronald Williams, revitaliza o interesse em redes neurais ao permitir um treinamento mais eficaz de perceptrons multicamadas.
  • 1992: Gerald Tesauro desenvolve o TD-Gammon, um programa de jogo de gamão que usa aprendizado por reforço e redes neurais para alcançar o nível de jogo de especialistas, demonstrando o potencial dessas técnicas para aprender com a experiência.
  • 1995: Richard Wallace cria o chatbot A.L.I.C.E (Artificial Linguistic Internet Computer Entity), baseado no programa ELIZA anterior, apresentando avanços no processamento de linguagem natural e IA conversacional.
  • 1997: O Deep Blue da IBM derrota o campeão mundial de xadrez Garry Kasparov, marcando um marco na capacidade da IA de dominar jogos estratégicos complexos.
  • 2001: A primeira versão do projeto Reconhecimento Automático de Fala em Condições Adversas (AURORA) é lançada para melhorar a tecnologia de reconhecimento de fala em ambientes desafiadores, levando a avanços significativos nesta área.
  • 2004: A IBM apresenta o IBM WebFountain, uma plataforma de análise de texto e mineração de dados em larga escala que utiliza técnicas de IA, como processamento de linguagem natural e aprendizado de máquina para analisar grandes quantidades de dados não estruturados na web.
  • 2006: Geoffrey Hinton e seus colaboradores cunham o termo “deep learning” e introduzem técnicas para o treinamento de redes neurais profundas, preparando o terreno para um ressurgimento na pesquisa de redes neurais.
  • 2010: A ascensão do big data, o aumento do poder computacional e os avanços nos algoritmos de aprendizagem profunda levam a avanços significativos na IA, particularmente em áreas como visão computacional, reconhecimento de fala e processamento de linguagem natural.
  • 2011: O sistema Watson AI da IBM ganha o Jeopardy! game show contra campeões humanos, mostrando suas proezas em compreensão de linguagem natural, recuperação de conhecimento e aprendizado de máquina. Esse sucesso destaca o potencial da IA em uma ampla gama de aplicações, incluindo saúde, finanças e atendimento ao cliente.
  • 2014: A IBM lança o Watson Developer Cloud, um conjunto de APIs e serviços que permitem aos desenvolvedores construir aplicativos alimentados por IA usando a tecnologia Watson da IBM. Essa iniciativa leva recursos de IA para uma gama mais ampla de indústrias e aplicações.
  • 2016: O AlphaGo do Google DeepMind derrota o campeão mundial de Go Lee Sedol em uma partida de cinco jogos, demonstrando avanços significativos na capacidade da IA de dominar jogos de estratégia complexos.
  • 2016: A IBM apresenta o Project Debater, um sistema de IA que pode se envolver em debates ao vivo com humanos analisando grandes quantidades de dados de texto, formulando argumentos e apresentando-os de maneira coerente. Este projeto mostra avanços na compreensão de linguagem natural e recursos de raciocínio da IA.
  • 2018: O modelo de linguagem GPT-2 da OpenAI demonstra capacidades impressionantes na geração de texto coerente e contextualmente relevante, destacando o potencial para modelos de linguagem em larga escala em IA.
  • 2020: A OpenAI lança o GPT-3, um modelo de linguagem ainda mais poderoso, mostrando sua capacidade de executar uma ampla gama de tarefas de processamento de linguagem natural com treinamento mínimo específico de tarefa.
  • 2021: O AlphaFold 2 do Google DeepMind alcança resultados inovadores na previsão da estrutura de proteínas, resolvendo um desafio de longa data na biologia molecular e abrindo novos caminhos para a descoberta de medicamentos e aplicações em biotecnologia.
  • 2022 em diante: Bard do Google, Bing Chat da Microsoft, Llama da Meta, Claude da Anthropic, dentre muitos outros sistemas focados em reconhecimento de textos, imagens, áudios, assim como criação e adaptação dos mesmos. Nesse link, há uma lista de várias IA’s úteis.
Síntese histórica

2 A RELAÇÃO ENTRE HISTÓRIA, OBJETIVOS E DEFINIÇÕES DE IA

É importante destacar que, ao abordar a história da IA, estamos considerando três grandes níves distintos que se pretende alcançar.

 Primeiramente, temos a IA estreita – fraca e especializada (estamos nessa fase), que são sistemas projetados para realizar tarefas específicas e limitadas. Essas IAs são especializadas em funções particulares, como reconhecimento de voz, tradução de idiomas, jogos específicos ou diagnóstico médico. Elas não possuem a capacidade de generalizar ou realizar tarefas fora de sua área específica de expertise.

Já a IA geral – forte ou completa, representa uma forma mais avançada, concebida para ter habilidades comparáveis às capacidades cognitivas humanas. Uma IA geral seria capaz de realizar uma ampla variedade de tarefas, assimilando conhecimento de maneira semelhante a um ser humano e aplicando esse conhecimento em contextos diversos.

Por fim, a superinteligência artificial, que se refere a um nível hipotético de IA que ultrapassa significativamente as habilidades cognitivas humanas em todas as áreas. Uma superinteligência artificial seria capaz não apenas de igualar, mas também de superar as capacidades intelectuais humanas em todos os aspectos, incluindo criatividade, resolução de problemas e compreensão complexa.

Ao longo do panorama histórico e aplicado da IA, os objetivos delineados para foram se estabelecendo conforme as definições em constante transformação, evoluindo em resposta aos avanços tecnológicos, ao aumento do poder computacional, à pesquisa contínua e à compreensão em constante mudança na área. Essa evolução reflete não apenas o progresso técnico, mas também a ampliação da compreensão sobre as capacidades e limitações da IA.

Um dos maiores problemas de integração da IA com outras áreas do conhecimento (além da falácia do espantalho, de as pessoas não estudarem o suficiente, etc.), se dá devido à sua vinculação ao conceito de inteligência humana (antropomorfismo de sempre), que em si ainda carece de uma definição coesa. Destaco cinco definições ao longo do tempo, revelando a evolução desses conceitos em paralelo aos objetivos da IA.

1956 – John McCarthy: “O problema de fazer máquinas se comportarem de maneiras que seriam chamadas de inteligentes se um ser humano se comportasse dessa maneira.” – McCartney, Myskin, Rochester e Shannon.

1968 – Marvin Minsky: “A ciência de fazer com que máquinas façam coisas que exigem inteligência se forem feitas por homens.”

1990 – Kurzweil: “A arte de criar máquinas que executam funções que desligam a inteligência quando feitas por pessoas.”

2013 – Russell e Norvig: “O estudo de sistemas cibernéticos formados por computadores, softwares, sensores e atuadores que imitam a inteligência dos seres humanos, resumindo-se na resolução de problemas por meio de aprendizado apoiado na percepção.”

2018 – Kaufman: “A ciência e engenharia de criar máquinas que tenham funções exercidas pelo cérebro dos animais.” 

proposta de Kaufman, ao evitar o termo “inteligência” e enfocar na “ciência e engenharia de criar máquinas que tenham funções exercidas pelo cérebro dos animais”, parece adotar uma abordagem mais específica e menos suscetível a antropomorfismos

Ao considerar que estamos tratando de entidades distintas no mundo, essa abordagem sugere a necessidade de desenvolver definições e medidas próprias para objetos não humanos, reconhecendo as peculiaridades e capacidades específicas dessas entidades (essa premissa é pessoal e opinativa, não sei se faria sentido à luz das pesquisas existentes sobre o tema). Isso, talvez, represente uma evolução na forma como definimos e compreendemos a IA, afastando-se de comparações diretas com a inteligência humana e reconhecendo as particularidades das capacidades das máquinas.

3 INTELIGÊNCIA HUMANA VS INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

Ao falar de IA, é essencial compreender as bases da inteligência humana, que se desdobram em três teorias principais

A primeira é a inteligência ecológica, vinculada à resolução de problemas para modular o ambiente em prol da sobrevivência. Essa forma de inteligência envolve estratégias para caçar, coletar alimentos, reproduzir e outras ações direcionadas à interação eficaz com o ambiente. 

A segunda, a inteligência social, diz respeito à capacidade de estabelecer conexões humanas, compreender e participar efetivamente em interações sociais. Essa forma de inteligência é crucial para a formação de relações dentro de grupos e comunidades, e contribui para o sentimento de pertencimento e cooperação. Envolve a empatia, a habilidade de interpretar e responder às emoções dos outros, a comunicação eficaz e a capacidade de trabalhar em equipe. 

Por fim, a terceira é a inteligência cultural, que se refere à capacidade de compreender, interpretar e participar de aspectos culturais compartilhados por uma comunidade ou grupo. Essa forma de inteligência envolve a assimilação de conhecimentos culturais, a compreensão das tradições, normas sociais, valores e a capacidade de transmitir essas informações para as gerações futuras. Em termos práticos, a inteligência cultural permite que os indivíduos se integrem e contribuam de maneira significativa para a sua comunidade.

Ao integrar essas “inteligências”, temos uma capacidade única de receber e processar simultaneamente uma ampla gama de estímulos, mas mais diversas dimensões. Relacionada a essa capacidade, temos um sistema sensorial e perceptível bastante refinado, que abrange:

  • Visão
  • Audição
  • Tato
  • Paladar
  • Olfato
  • Intuição (mediada pela memória)
  • Emoções
  • Senso de comunidade
  • Habilidades motoras finas
  • Orientação espacial e percepção do tempo

Esse conjunto harmônico de sentidos e habilidades permite que os seres humanos realizem proezas notáveis, como participar de uma conversa enquanto continuam percebendo o ambiente ao redor, de se comunicar e se fazer entendido, por mais que o domínio de um idioma não seja perfeito, de abrir uma garrafa de água, sem destruí-la com força excessiva, dentro outros. Ainda, a habilidade de processar informações em milissegundos, independentemente do contexto, destaca a eficiência e adaptabilidade do cérebro humano, sendo para mim a que mais nos difere das máquinas.

É preciso reconhecer que essas características distintas da inteligência humana representa um desafio significativo para replicar em inteligências artificiais, afinal, são 3,5 bilhões de evolução que, possivelmente (opinião), não poderá ser replicado em máquinas (não enquanto tantas lacunas sobre o comportamento humano estiverem faltando). 

Embora as IAs possam ser programadas para executar tarefas específicas de forma excepcional, a capacidade única de processar uma variedade tão vasta de estímulos simultaneamente permanece uma característica distintiva da inteligência humana.

Por fim, todas essas características nos levam a fenômenos superiores, que englobam:

  • Metaconsciência, permitindo a compreensão do que está sendo falado, sentido e a consciência do próprio eu-agora. Essa capacidade estende-se à metacognição, facultando a habilidade de refletir sobre pensamentos e emoções, proporcionando uma compreensão profunda do próprio estado mental.
  • memória episódica é uma característica marcante, possibilitando a recordação precisa de eventos passados. Mais incrível, a meu ver, essa capacidade não se limita à lembrança, pois permite a utilização dessas experiências passadas para construir hipóteses sobre o futuro. Essa projeção temporal é uma habilidade distintiva que contribui para a tomada de decisões informada e adaptável.
  • linguagem, elemento fundamental da comunicação humana, é uma expressão rápida, intuitiva e precisa, refletindo a complexidade da cognição humana. 
  • aprendizado dual, abrangendo tanto a aprendizagem concreta quanto a abstrata, demonstrando a flexibilidade e a adaptabilidade do processo de aquisição de conhecimento humano.

Uma das principais limitações enfrentadas pelas IA’s reside na natureza segmentada dos estímulos que recebem. Ao contrário da complexidade da experiência humana, em que diversos estímulos sensoriais são processados simultaneamente, as IA’s muitas vezes lidam com informações isoladas e específicas.

Não é à toa que as áreas em que ela tem maior efetividade são bem demarcadas:

  • Reconhecimento de Fala: Sistemas de IA são capazes de transcrever e interpretar a fala humana com precisão, facilitando a interação por meio de assistentes de voz e sistemas de reconhecimento de comandos.
  • Reconhecimento de Texto: Algoritmos de processamento de linguagem natural são empregados para analisar e compreender texto, possibilitando a extração de informações relevantes, resumo automático de documentos e análise de sentimentos.
  • Reconhecimento de Imagens: A IA é eficaz na identificação e classificação de objetos em imagens, sendo amplamente utilizada em aplicativos de visão computacional, como reconhecimento facial, diagnóstico médico por imagem e automação industrial.
  • Tradução Automática: Sistemas de tradução automática baseados em IA têm evoluído, permitindo a tradução rápida e precisa entre diferentes idiomas.
  • Processamento de Linguagem Natural (PLN): Compreensão e geração de linguagem natural, possibilitando a interação mais natural entre humanos e sistemas de IA. Isso inclui chatbots, assistentes virtuais e sistemas de resposta automática.
  • Aprendizado de Máquina em Jogos: A IA tem se destacado em jogos estratégicos, como xadrez e Go, superando campeões humanos. O exemplo clássico é o Deep Blue, que derrotou Garry Kasparov no xadrez.
  • Veículos Autônomos: A IA desempenha um papel crucial em sistemas de direção autônoma, interpretando dados de sensores para navegar com segurança no ambiente.
  • Diagnóstico Médico: Em algumas áreas da medicina, sistemas de IA são utilizados para auxiliar no diagnóstico de doenças por meio da análise de dados médicos, imagens de exames e histórico do paciente.
  • Geração de Conteúdo: A IA é empregada na criação automática de conteúdo, como textos, imagens e músicas, embora essa área ainda esteja em desenvolvimento.

O estado atual das IA’s ainda bastante estreita, distante de ser geral. Apesar disso, cada uma dessas áreas em que as IA’s demonstram habilidades excepcionais, já é possível vislumbrar diversas novas possibilidades para a vida humana. 

Talvez o grande problema do avanço desenfreado dessa tecnologia, acompanhado de desafios éticos decorrentes da falta de regulamentação, reside no fato de que a referência para a IA é, como mencionei antes, a inteligência humana. Afinal, a complexidade de um comportamento não implica necessariamente em inteligência. Podemos concordar que a Siri ou Alexa executam tarefas complexas, mas seria apropriado chamá-las de inteligentes? (A Alexa, por exemplo, não compreende a maioria das músicas que solicito!).

Pontuo novamente que: o antropomorfismo, ao avaliar máquinas com base em conceitos, ideias e habilidades humanas, é problemático. Estamos tentando alcançar um objetivo que talvez seja inatingível e forçando a barra com isso! 

É possível que as máquinas precisem desenvolver sua própria métrica para a avaliação da inteligência, assim como sua definição própria de inteligência.

Tenho uma teoria de que há um espectro entre comportamento complexo e comportamento inteligente, sofisticado. Nessa perspectiva, o comportamento complexo é mais inato, enquanto a inteligência é caracterizada por uma sofisticação que envolve a capacidade de extrapolarmos nossas habilidades, originalmente voltadas para a sobrevivência e interações simples com o ambiente, para lidar com situações mais complexas.

Por exemplo, uma habilidade inata são as respostas motoras finas precisas, que foram sendo selecionadas ao longo da evolução para manejar ferramentas, manejar itens do ambiente, etc. Isso seria um comportamento complexo. Talvez um comportamento sofisticado a partir disso seria a minha habilidade motora aplicada a tocar piano. É uma habilidade inata, pré-existente, complexa que, por processo de aprendizagens no nível ontogenético, me faz criar melodias, criar música e instrumentos musicais. Há alguns ideiais sobre isso referente aos animais também, conforme imagem abaixo.

Uma teoria "mucho loca" que preciso pensar e desenvolver mais

4 COMO E ONDE SE APLICA IA NA PSICOLOGIA?

Podemos considerar duas principais necessidades para sua implementação de uma IA: um extenso banco de dados e análises estatísticas robustas, como técnicas de análise estatística multivariada. Ao abordar estatísticas, destacamos as análises univariadas, bivariadas e, principalmente, as multivariadas, que formam a base da inteligência artificial.

Para tratamento desses dados, várias abordagens são empregadas:

Tipos de aprendizado de máquina

Nas aplicações em saúde mental, a IAé utilizada em diagnóstico e triagem por meio de algoritmos que analisam dados clínicos, questionários e registros de saúde eletrônicos, inclusive dados de mídias sociais para identificar padrões e sintomas associados a transtornos mentais.

Além disso, é empregada na previsão de riscos e intervenções precoces, identificando indivíduos em risco de desenvolver doenças mentais e prevendo comportamentos suicidas para permitir intervenções personalizadas. 

personalização do tratamento, análise de imagens para identificar padrões associados a doenças mentais e o monitoramento remoto e intervenção são outras áreas em que a IA desempenha um papel crucial na prática clínica, especialmente na saúde mental.

Por fim, essas aplicações incluem a utilização da Avaliação Ecológica Momentânea (EMA) (que para mim é onde haverá mais ganhos para a psicologia clínica na aplicação da IA) para coletar dados em tempo real e de maneira precisa, destacando-se como uma potencial ferramenta valiosa para psicólogos na condução de tratamentos psicológicos baseados em evidências (se não sabe o que é isso, esse artigo elucida detalhamento isso!).

Algumas possibilidades futuras da IA na saúde mental incluem:

  • O desenvolvimento, retro tradução e redução de itens de instrumentos psicométricos.
  • Avaliação diagnóstica e avaliação da eficácia do tratamento (uma grande contribuição para o monitoramento do progressa, por exemplo, com EMA, e mensuração de resultados, com escalas curtas e confiáveis)
  • Possivelmente um novo sistema de classificação específico baseado em IA.
  • Integração de tecnologias como realidade virtual e aumentada com a inteligência artificial, proporcionando intervenções virtuais realistas (pensem que legal isso seria em intervenções baseadas em exposição!)
  • Gestão de negócios, assistentes virtuais para negócios e saúde
  • Ensino e treinamento com simulações realistas.

Considerando a ética, ainda é necessário regulamentar diversos aspectos da aplicação da IA na saúde, e a grande questão é a escassez de especialistas no tema, somada à sua evolução constante. Portanto, é crucial acelerar nossos esforços de estudo e pesquisa para garantir que esse desenvolvimento ocorra de maneira ética.

5 PONTOS FORTES E LIMITAÇÕES DA IA

Concluindo, os pontos fortes da IA incluem:

 

 

  • Um processamento rápido de informações, principalmente aqueles que envolvem raciocínio lógico-matemático
  • Dados que envolvem imagens, como ressonâncias magnéticas, são melhor interpretados pela IA.
  • Não há interferência emocional, mantendo o foco em um objetivo sem ceder aos estímulos concorrentes.
  • Já realiza tradução de texto ao nível humano.
No entanto, algumas limitações da IA também são evidentes. 
  • É extremamente suscetível a ataques contraditórios, o que a faz generalizar o aprendizado equivocadamente.
  • É sensível demais a informações específicas, às vezes irrelevantes. 
  • Se baseia em um processamento visual bottom-up, classificando formas, bordas, cor e características gerais, mas não segue para o top-down, que envolve conceitos e definições. 
  • Precisa de regras muito bem definidas, diferentes das complexidades reais, e não se fundamenta em experiência e ação, processando informações apenas por meio de sentidos específicos.
  • Percepção muito limitada, seja no aspecto visual, textual ou auditivo. Não possui uma teoria da informação integrada e contextual, o que impede que se afirme que ela tenha consciência. 
  • O antropomorfismo faz com que superestimemos as conquistas da IA; um comportamento complexo não implica necessariamente em inteligência. 

6 CONCLUSÕES

Por fim, uma pergunta pertinente que Jeffrey (2015) levanta é:

“Será que podemos ser melhores do que 3.5 bilhões de anos de evolução nos fizeram ser?”

Jeffrey conclui que não, e eu concordo com ela. Ela complementa dizendo que “é um enorme ato de arrogância acreditar que é possível alcançar ou superar a inteligência humana em um sistema de inteligência artificial.”

Certamente, é inegável afirmar que o futuro nos reserva possibilidades emocionantes na integração entre IA e psicologia, tanto no nível teórico quanto prático. No entanto, cabe a nós moldá-lo com responsabilidade e sabedoria, além de manter um compromisso com os estudos nessa área (uma lista de referências iniciais pode ser acessada aqui), reconhecendo que a busca pelo conhecimento é fundamental para enfrentar os desafios éticos, regulatórios e científicos associados a essa revolução tecnológica.

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  2. CORMACK, F.; MCCUE,M.; TAPTIKLIS, N.; SKIRROW, C.; GLAZER E.; PANAGOPOULOS, E.; VAN SCHAIK, T. A.; FEHNERT, B.; KING, J.; BARNETT, J. H. Wearable Technology for High-Frequency Cognitive and Mood Assessment in Major Depressive Disorder: Longitudinal Observational Study. JMIR Ment Health, v. 6, n. 11, 2019. https://bit.ly/3qmbBvf.  
  3. COZMAN, F. G. Inteligência Artificial: uma utopia, uma distopia. Teccogs: Revista Digital de Tecnologias Cognitivas, n. 17, pp. 32-43, 2018. http://bit.ly/3Zyzocl
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  5. DWYER, D. B.; FALKAI, P.; KOUTSOULERIS, N. Machine Learning Approaches for Clinical Psychology and Psychiatry. Annual Review of Clinical Psychology, v. 14, n. 1, pp. 91–118, 2018. https://bit.ly/3yvx4Gg.
  6. EYSENCK, M.; EYSENCK, C. Inteligência Artificial x Humanos: o que a ciência cognitiva nos ensina ao colocar frente a frente a mente humana e a IA. Artmed, 2023.
  7. GONÇALVES, J. Tecnologia Digital baseada em Técnicas de Inteligência Artificial para identificar fatores de risco e proteção da depressão em acadêmicos (Dissertação de mestrado). Programa de Pós-Graduação, Mestrado Profissional em Psicologia, Universidade do Vale do Itajaí, 108 f, 2023.
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Júlio Gonçalves

Psicólogo e Supervisor

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