Escrito por Júlio Gonçalves
A exposição imaginada é uma intervenção psicoterápica utilizada no tratamento de transtornos de ansiedade, como transtorno de ansiedade generalizada, fobias específicas e pânico. Trata-se de uma intervenção que permite ao paciente enfrentar mentalmente situações que despertam ansiedade, mas de forma controlada e segura. O objetivo é reduzir o medo e os comportamentos de evitação, ajudando o indivíduo a construir uma relação mais saudável com suas emoções.
Antes de iniciar a exposição imaginada, é preciso entender como a ansiedade funciona e como nossas escolhas ao enfrentá-la podem reforçar ou enfraquecer os mecanismos que a mantêm.
ANSIEDADE: ENFRENTAR OU EVITAR?
Quando nos deparamos com uma situação temida, ou até mesmo quando apenas pensamos nela, surgem duas possibilidades principais: enfrentar o medo ou evitá-lo. A evitação, embora pareça uma solução a curto prazo, tem custos significativos. Ela pode ir além de simplesmente fugir da situação, incluindo ações como buscar garantias, preparar-se excessivamente ou realizar comportamentos que reduzam temporariamente a ansiedade.
A evitação, no entanto, é um ciclo perigoso. Ela reduz a ansiedade momentaneamente, mas reforça a ideia de que a situação é de fato perigosa. Isso faz com que, a cada nova exposição à mesma situação, o medo volte mais intenso. Por exemplo, imagine Sofia, que envia mensagens constantemente ao filho para garantir que ele está seguro. Essa ação reduz sua ansiedade temporariamente, mas também reforça a crença de que algo ruim pode acontecer se ela não buscar esse tipo de tranquilização.
O alívio imediato torna a evitação um hábito difícil de romper, criando um ciclo de dependência e perpetuação do medo.
Por outro lado, a escolha de enfrentar os medos, tem um efeito oposto. Quando você não evita a situação temida, a ansiedade inicialmente aumenta, atinge um pico, mas eventualmente começa a diminuir. Com a repetição desse processo, o pico de ansiedade torna-se progressivamente mais baixo, e o desconforto desaparece mais rapidamente.
Ao enfrentar o medo de forma repetida, o cérebro percebe que o “sinal de alarme” acionado é, na verdade, um falso alarme. Essa prática reduz a intensidade da resposta ao medo e aumenta a tolerância à ansiedade.
Antes de aplicar a exposição imaginada, é crucial explicar ao paciente como funciona essa curva da ansiedade. A psicoeducação também esclarece os efeitos prejudiciais da evitação, como discutido anteriormente, e prepara o paciente para o processo de exposição. Uma analogia útil é a da “barata na sala”: se você entrar em uma sala com uma barata a dez metros de distância, seu nível de ansiedade será alto no início, mas diminuirá naturalmente com o tempo, mesmo que a barata continue no mesmo lugar. E conforme vamos aproximando a barata, gradualmente, o mesmo efeito irá ocorrer, repetidamente.
APLICAÇÃO DA EXPOSIÇÃO IMAGINADA
1. Criação do roteiro
A técnica começa com a construção de roteiros que descrevem cenas relacionadas à situação temida. Esses roteiros devem ser detalhados, escritos na primeira pessoa e no presente, incorporando detalhes sensoriais, como imagens, sons e sensações físicas. Por exemplo: TAG:
- Imaginar receber uma ligação com notícias ruins sobre um ente querido.
- Fobia de avião: Visualizar o processo de embarque, decolagem e voo.
- Agorafobia: Enfrentar o desconforto de estar em um local fechado, como um elevador.
2. Seleção do cenário inicial
Identifique situações que geram ansiedade no paciente, priorizando aquelas que são significativas e específicas. Selecione um cenário inicial que seja desafiador, mas não excessivamente aversivo, permitindo um progresso gradual. Exemplo: Um paciente com fobia de falar em público pode começar imaginando uma reunião pequena antes de simular uma apresentação para uma grande plateia.
3. Estruturação do roteiro
- Escreva o roteiro na primeira pessoa, no tempo presente e inclua o máximo de detalhes sensoriais possíveis para tornar a cena mais realista.
- Visual: Como é o lugar? (ex.: “Estou em uma sala de reunião com uma mesa grande e cadeiras ao redor.”)
- Sonoro: Quais sons estão presentes? (ex.: “Ouço o som do ar-condicionado e algumas pessoas conversando.”)
- Tátil e outros sentidos: Inclua sensações físicas ou cheiros. (ex.: “Sinto a textura do papel em minhas mãos.”)
- Relacione os sintomas físicos de ansiedade experimentados. (ex.: “Meu coração está acelerado, sinto as mãos suando.”)
- Insira os pensamentos que surgem na situação. (ex.: “E se eu esquecer o que vou falar?”)
- Descreva as emoções associadas. (ex.: “Sinto uma mistura de nervosismo e vergonha.”)
- Explore o impacto emocional da situação e seu significado. (ex.: “Acredito que se eu gaguejar, todos pensarão que sou incompetente.”)
4. Ajuste os detalhes sensoriais
Pergunte ao paciente o que ele imagina ao visualizar a cena e ajuste os detalhes do roteiro para torná-lo mais vívido. Exemplo: Se a ansiedade do paciente aumenta quando ele ouve vozes de julgamento, insira sons específicos no roteiro, como “ouço alguém sussurrando algo que pode ser sobre mim”.
5. Teste o roteiro com o paciente
Leia o roteiro com o paciente para verificar se ele consegue se conectar com a cena e se ela evoca as emoções esperadas. Use a Escala de Unidades Subjetivas de Desconforto (SUDS) para medir a intensidade da ansiedade durante o teste. Caso a cena não seja suficientemente evocativa, adicione mais detalhes ou ajuste as descrições.
6. Refinamento e Progresso
Com o tempo, à medida que o paciente habitua-se ao primeiro cenário, avance para roteiros mais desafiadores. O progresso pode ser feito aumentando a intensidade ou a complexidade da cena. Exemplo: Para um paciente com fobia de avião, comece com o roteiro de esperar no terminal e, posteriormente, inclua a decolagem e a turbulência.
Um passo a passo detalhado, com exemplos de roteiros, pode ser baixado abaixo.
Guimarães, S. S. (2011). Técnicas cognitivas e comportamentais. In B. Rangé (Ed.), Psicoterapias Cognitivo-Comportamentais – Um Diálogo com a Psiquiatria (2ª ed., pp. 181–182). Artmed.
Hofmann, S. G. (2022). Lidando com a ansiedade: estratégias de TCC e mindfulness para superar o medo e a preocupação. Artmed.
Júlio Gonçalves
Psicólogo e Supervisor
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