Julio Gonçalves

Felicidade: como a percepção de controle na vida eleva satisfação e bem-estar

Clássicos filósofos estóicos, como Epicteto, argumentavam que a felicidade dependia de uma compreensão precisa do que estava e do que não estava sob o controle de uma pessoa, e de uma atitude positiva em relação ao que não estava sob controle

Por outro lado, teóricos psicológicos modernos, como Bandura e Deci & Ryan, argumentam que o bem-estar depende de uma sensação de controle sobre os eventos e circunstâncias da vida

Os autores deste artigo concordam que o controle é fundamental para o bem-estar, e argumentam que o controle pode ser alcançado de duas maneiras diferentes: através do controle primário e do controle secundário

Eles explicam que o controle primário envolve a mudança do ambiente para se adequar às necessidades do indivíduo, enquanto o controle secundário envolve a mudança das próprias expectativas e atitudes para se adequar ao ambiente. Ambas as estratégias são importantes para o bem-estar e a falta de controle pode levar a problemas de saúde mental e física.

Com essa hipótese em mente, objetivo da pesquisa foi explorar a relação entre as estratégias de controle primário e secundário e o bem-estar subjetivo, especificamente a experiência afetiva diária e a satisfação com a vida. Os autores comentam que entender isso pode fornecer insights sobre como as pessoas podem aplicar essas estratégias de controle em suas próprias vidas para melhorar seu bem-estar e felicidade (olha a aplicabilidade clínica aí!).

A metodologia utilizada no estudo envolveu a coleta de dados de duas amostras distintas: uma amostra de estudantes universitários e uma amostra de membros da comunidade

Foram utilizados métodos de avaliação retrospectiva da experiência afetiva diária, bem como da satisfação com a vida. A experiência afetiva foi avaliada por meio de um método de diário modificado, que permitiu aos participantes relatarem seus sentimentos positivos e negativos ao longo de um dia aleatório de suas vidas. A satisfação com a vida foi avaliada utilizando uma medida proeminente de satisfação global com a vida.

Além disso, foram utilizadas medidas de controle primário e secundário, baseadas na distinção fundamental entre mudar o mundo para se adequar ao self (controle primário) e mudar o self para se adequar ao mundo (controle secundário). Os participantes responderam a itens relacionados a essas medidas em uma escala de Likert.

A amostra do estudo 1 consistiu em 144 participantes recrutados de um pool de participantes universitários nos Estados Unidos, enquanto a amostra do estudo 2 foi composta por 407 participantes 

 Os resultados revelaram que tanto o controle primário quanto o controle secundário estavam significativamente correlacionados com o bem-estar subjetivo

No entanto, após controlar a sobreposição entre as facetas do bem-estar subjetivo, as medidas afetivas estavam mais fortemente associadas ao controle primário do que ao controle secundário. 

Além disso, diferenças significativas foram observadas entre os dois estudos em relação à satisfação com a vida e ao controle secundário, com associações significativas em um estudo, mas não no outro.

Os resultados também indicaram que a interação entre o status de relacionamento dos participantes e o controle secundário foi significativa na predição da satisfação com a vida. Especificamente, o controle secundário foi um preditor significativo da satisfação com a vida para participantes não comprometidos, mas não para participantes comprometidos. 

Além disso, os resultados mostraram que as medidas de afeto e satisfação estavam relacionadas de forma distinta ao controle primário e secundário, com associações mais fortes entre o controle primário e o afeto positivo e entre o controle secundário e o afeto negativo.

Sobre as limitações do estudo, estas incluem o uso de amostras específicas, o que pode limitar a generalização dos resultados para a população em geral. Além disso, a natureza autorrelatada das medidas de controle e bem-estar subjetivo pode introduzir viéses e imprecisões nos dados coletados.

Outra limitação está relacionada à natureza transversal do estudo, o que impede a inferência de relações causais entre as variáveis estudadas. Estudos longitudinais poderiam fornecer uma compreensão mais robusta das relações entre controle e bem-estar ao longo do tempo.

Também é importante considerar que outros fatores não abordados neste estudo, como traços de personalidade e contextos culturais, podem influenciar a relação entre controle e bem-estar subjetivo.

Em resumo:

  • Distinção entre controle primário e controle secundário: o estudo destaca a importância de diferenciar entre controle primário (orientado para a busca de objetivos) e controle secundário (orientado para a compreensão e aprendizado experiencial) na predição do bem-estar subjetivo.
  • Associações com o bem-estar subjetivo: os resultados indicam que tanto o controle primário quanto o controle secundário estão associados ao bem-estar subjetivo, mas de maneiras distintas, com o controle primário mais fortemente relacionado ao afeto positivo e o controle secundário mais fortemente relacionado ao afeto negativo.
  • Interação com o status de relacionamento: o estudo revela uma interação significativa entre o status de relacionamento dos participantes e o controle secundário na predição da satisfação com a vida, sugerindo que o impacto do controle secundário pode variar com base no status de relacionamento.
  • Implicações para a promoção do bem-estar: as descobertas têm implicações práticas para a promoção do bem-estar, indicando que tanto o controle primário quanto o controle secundário desempenham papéis importantes, e que a aplicação dessas estratégias pode variar com base no contexto individual.

Como é complexa essa relação entre controle e bem-estar subjetivo, não é? Mas, o mais interessante são os insights para pesquisas futuras e para a aplicação prática disso.

Helzer, E. G., & Jayawickreme, E. (2015). Control and the “Good Life”: Primary and Secondary Control as Distinct Indicators of Well-Being. Social Psychological and Personality Science, 6(6), 653-660. https://doi.org/10.1177/1948550615576210

Júlio Gonçalves

Psicólogo e Supervisor

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