Diferenças entre Depressão Unipolar e Depressão Bipolar

O Dr. Osser é professor associado de psiquiatria na Harvard Medical School, em Boston, Massachusetts; psiquiatra no Veterans Affairs (VA) Boston Healthcare System, Brockton Division; e codiretor do VA National Bipolar Disorders TeleHealth Program. Ele não relata conflitos de interesse em relação ao tema deste artigo.

Embora os critérios diagnósticos do DSM-5-TR para um episódio depressivo sejam os mesmos para a depressão maior unipolar e a depressão bipolar, essas condições diferem em sua história natural, idade de início, risco de suicídio, comorbidades associadas e correlações biológicas. O mais importante é que os tratamentos eficazes para cada uma delas são drasticamente diferentes. Portanto, é fundamental diagnosticar corretamente essas depressões.

Importância de um Histórico Detalhado de Hipomania ou Mania

Para diferenciar corretamente a depressão bipolar da depressão unipolar, é essencial obter um histórico minucioso sobre episódios de hipomania ou mania. Muitos erros diagnósticos ocorrem nesse processo. Deve-se começar explicando ao paciente a importância de um diagnóstico correto para um tratamento eficaz, alertando sobre os riscos de um diagnóstico errado, que pode levar a um tratamento inadequado, ineficaz ou até prejudicial.

Um exemplo é o uso de antidepressivos em pacientes bipolares, que pode levar à transformação maligna do transtorno bipolar, resultando em ciclos rápidos e resistência ao tratamento. Essa explicação pode ajudar a reduzir a resistência do paciente em relatar sintomas maníacos devido ao estigma associado ao diagnóstico, à sensação prazerosa da mania ou à crença de que esse estado reflete seu humor e energia normais.

Características dos Episódios Maníacos e Hipomaníacos

É importante descrever detalhadamente um episódio de mania ou hipomania para que o paciente possa reconhecer os sintomas:

  • Início: Os episódios maníacos geralmente começam sem um fator precipitante. Diferem de estados de agitação associados ao transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), que são desencadeados por memórias ou interações. Enquanto no TEPT os sintomas diminuem após o afastamento do gatilho, na mania o início pode ocorrer ao despertar, com duração prolongada.
  • Sintomas iniciais: O paciente pode apresentar pensamentos acelerados, grande número de planos, energia e motivação incomuns, sensação de invencibilidade, desejo de iniciar novos projetos e contato com amigos negligenciados.
  • Mudanças na Fala: A primeira pessoa a notar a mudança costuma ser um cônjuge ou familiar próximo, percebendo um aumento na velocidade da fala. Os pacientes podem omitir sílabas ou palavras devido à rapidez do pensamento.
  • Comportamento expansivo: O indivíduo fala mais que o habitual, apresenta desinibição, aborda temas polêmicos e pode entrar em discussões com familiares e amigos devido a planos irrealistas. Essa inflexibilidade e confiança excessiva podem gerar conflitos.
  • Diminuição da Necessidade de Sono: O paciente pode sentir pouca ou nenhuma necessidade de dormir por noites consecutivas. Durante esse período, gastos impulsivos são comuns, incluindo compras de roupas, veículos e investimentos imprudentes.
  • Contraste com TEPT: No TEPT, os pensamentos acelerados geralmente envolvem traumas e preocupações, enquanto na mania os pensamentos são voltados para projetos e objetivos otimistas. Pacientes com ambas as condições podem ter noites de insônia por diferentes motivos.
  • Finalização do Episódio: Após dias ou semanas, a mania termina abruptamente, seguida de uma “queda” para um estado depressivo. A pessoa perde o interesse pelos projetos iniciados, sente-se esgotada e pode apresentar retraimento social e ideação suicida.

 

Impactos Funcionais da Mania

Pacientes com episódios maníacos frequentemente deixam vestígios visíveis, como ferramentas e materiais espalhados por projetos inacabados. Quando ocorre um novo episódio, tendem a iniciar novas atividades, sem concluir as anteriores, o que pode gerar conflitos familiares.

Descrever a mania dessa maneira pode levar de 5 a 10 minutos. Depois, é importante perguntar ao paciente se ele já teve experiências semelhantes. Mesmo que esses episódios tenham ocorrido há muitos anos, ainda são relevantes para o diagnóstico.

As respostas do paciente podem indicar três cenários:

  1. Confirmação do diagnóstico: O paciente reconhece imediatamente os sintomas e se surpreende com a precisão da descrição.
  2. Ausência de sintomas: A hiperatividade pode estar associada a eventos traumáticos ou conflitos interpessoais e não a um transtorno bipolar.
  3. Sintomas parciais: O paciente relata algumas características, mas não todas. Nesses casos, é necessário aprofundar a investigação para avaliar se há critérios suficientes para o diagnóstico.

 

Diagnóstico Diferencial e Classificação do Transtorno Bipolar

Após identificar episódios maníacos, o próximo passo é avaliar:

  • Duração dos episódios
  • Frequência dos ciclos (ciclagem rápida se houver quatro ou mais episódios por ano)
  • Tipo de transtorno bipolar (Bipolar I ou II)

O transtorno bipolar I é facilmente diagnosticado se houver histórico de psicose durante as manias ou hospitalizações. Outra forma de diagnosticar o bipolar I é avaliar se houve prejuízo significativo no funcionamento social ou ocupacional devido à mania.

Impacto no Relacionamento

O comprometimento nos relacionamentos pode ocorrer devido à hipersexualidade, infidelidade, exigências excessivas do parceiro ou consumo problemático de pornografia. Esses comportamentos podem causar sentimentos de vergonha no paciente, sendo recomendável abordar esse tema apenas após estabelecer um bom vínculo terapêutico.

Além disso, episódios maníacos podem gerar conflitos intensos com familiares e amigos, inclusive episódios de violência doméstica.

Impacto no Trabalho

O paciente pode apresentar comportamento desafiador no ambiente profissional, entrar em discussões com superiores ou até pedir demissão impulsivamente. Muitos pacientes com transtorno bipolar I possuem um histórico de múltiplos empregos em curto período devido a comportamentos maníacos.

Depressão Pré-Bipolar e Preditores de Conversão para Bipolaridade

Caso o paciente não tenha histórico de episódios maníacos ou hipomaníacos, ainda pode estar em um estado de depressão pré-bipolar, com risco de desenvolver mania futuramente. A conversão de um diagnóstico de depressão unipolar para bipolar pode ocorrer em idosos após décadas de episódios depressivos.

Os fatores preditivos para essa conversão incluem:

  • Histórico familiar de transtorno bipolar
  • Início precoce da depressão
  • Presença de ansiedade e ataques de pânico
  • Histórico familiar de suicídio
  • Resposta ruim a antidepressivos (mesmo uma única falha terapêutica deve levantar suspeitas)
  • Irritabilidade, agitação ou ideação suicida induzidas por antidepressivos
  • Presença de sintomas psicóticos
  • Histórico de depressão ou psicose pós-parto

Se esses fatores estiverem presentes, especialmente em pacientes com múltiplas falhas ao tratamento antidepressivo, pode ser prudente considerar a depressão como bipolar e tratar de acordo.

Considerações Finais

A correta identificação do transtorno bipolar é essencial para um tratamento adequado e para evitar intervenções ineficazes ou prejudiciais. O uso indevido de antidepressivos pode agravar a doença, tornando-a resistente ao tratamento e contribuindo para ciclos rápidos.

No caso de diagnóstico de transtorno bipolar, o manejo deve ser cuidadoso, evitando antidepressivos em casos de bipolaridade tipo I ou de ciclagem rápida. A abordagem terapêutica será discutida em publicações futuras.

Post, R. M. (2018). Preventing the malignant transformation of bipolar disorder. JAMA, 319(12), 1197-1198. 

El-Mallakh, R. S., Ghaemi, S. N., Sagduyu, K., et al. (2008). Antidepressant-associated chronic irritable dysphoria (ACID) in STEP-BD patients. Journal of Affective Disorders, 111(2-3), 372-377. 

El-Mallakh, R. S., Vöhringer, P. A., Ostacher, M. M., et al. (2015). Antidepressants worsen rapid-cycling course in bipolar depression: A STEP-BD randomized clinical trial. Journal of Affective Disorders, 184, 318-321. 

Faedda, G. L., Baldessarini, R. J., Marangoni, C., et al. (2019). An International Society of Bipolar Disorders task force report: Precursors and prodromes of bipolar disorder. Bipolar Disorders, 21(8), 720-740. 

Inscrever-se
Notificar de
0 Comentários
mais antigos
mais recentes Mais votado
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários