Conteúdo escrito por Jennifer Craco
Chegamos ao último problema da nossa série de vieses cognitivos! Vimos, nas partes 1, 2 e 3, que nosso cérebro não sabe muito bem lidar com todas as informações do ambiente – e, por isso, ele às vezes pega alguns atalhos para poupar o máximo de esforço que puder. Na parte 1, falamos sobre vieses relacionados a momentos em que ocorre uma sobrecarga de informação no meio em que estamos: o que é relevante para que nosso cérebro processe? O que podemos “deixar passar”? Após isso, entramos na parte 2: a temida falta de sentido. Quando nos deparamos com situações que não compreendemos direito, como nosso cérebro preenche as lacunas informacionais? Por fim, na parte 3 abordamos mais sobre a necessidade de agir rápido no ambiente. Caso você não lembre muito bem, te convidamos a retomar (rapidinho) a leitura dos pontos-chave das duas primeiras partes dessa série de vieses cognitivos. Lembramos que essa série de posts é inspirada por este resumão. Agora, entraremos em nosso último tópico: descobrir o que precisa ser lembrado para depois.
DE QUE DEVERÍAMOS NOS LEMBRAR, AFINAL?
Existe muita informação no universo. Muita, mesmo. É natural que só consigamos reter uma pequena parte disso – aquela que nos seria mais útil. Vivemos constantemente fazendo trocas, apostas e negociações, tentando compreender o que deveríamos lembrar e o que podemos esquecer. Por exemplo, fazer generalizações sobre um determinado tópico nos poupa um tanto de espaço e tempo; quando nos deparamos com muitos detalhes, salvamos alguns deles e descartamos o restante. Percebe como todos os tópicos sobre os quais falamos até agora se reforçam entre si? Este último, por exemplo, “regula” o que será preservado nos tópicos 1 e 2.
CONJUNTO 1 – Fato é que editamos e reforçamos algumas informações após algum fato. Durante esse processo, nossas lembranças podem ficar mais “fortes” para algumas questões em específico – mas alguns detalhes acabam por se perder. Às vezes, até adicionamos algum detalhe que nunca nem esteve ali. Faz parte. Os vieses relacionados a isso são os seguintes:
Erro de atribuição da memória: Refere-se ao fenômeno de lembrar algo, mas atribuir incorretamente a origem dessa lembrança, confundindo a fonte ou o contexto de onde a informação veio.
Confusão de fonte: Ocorre quando uma pessoa se lembra de uma informação, mas não consegue identificar corretamente sua origem, misturando eventos ou fontes diferentes.
Criptomnésia: Um tipo de amnésia em que uma pessoa acredita estar criando uma ideia original, quando, na verdade, está se lembrando de algo previamente aprendido ou visto.
Confabulação: Refere-se à criação de memórias de eventos que nunca aconteceram ou à distorção de memórias existentes, levando a crenças equivocadas sobre o passado.
Sugestionabilidade: Envolve a tendência de uma pessoa incorporar informações externas incorretas ou enganosas em suas memórias, especialmente quando sugerido por outras pessoas.
Efeito de espaçamento: É o fenômeno em que informações são mais bem retidas na memória quando o aprendizado é distribuído ao longo do tempo, em vez de concentrado em um único período.
CONJUNTO 2 – Ademais, descartamos algumas especificidades em prol de algo mais geral e genérico. É por necessidade que fazemos isso; mas não podemos negar o impacto de coisas como estereótipos e preconceitos nesse processo. Isso gera algumas consequências negativas para nosso cotidiano. Veja alguns exemplos de vieses:
Associações implícitas: Refere-se a conexões automáticas e inconscientes que fazemos entre conceitos, pessoas ou objetos, muitas vezes baseadas em experiências culturais ou sociais anteriores.
Estereótipos implícitos: São crenças ou suposições inconscientes sobre grupos sociais específicos, influenciando julgamentos e comportamentos sem que a pessoa perceba.
Viés estereotípico: A tendência de aplicar estereótipos generalizados a indivíduos, levando a avaliações tendenciosas e imprecisas com base em categorias sociais.
Preconceito: Atitudes ou crenças negativas, geralmente infundadas, em relação a um grupo ou indivíduo com base em sua associação a uma determinada categoria social.
Viés do enfraquecimento afetivo: Fenômeno em que emoções negativas associadas a uma memória tendem a desaparecer mais rapidamente ao longo do tempo do que as emoções positivas.
CONJUNTO 3 – Também reduzimos eventos e listas aos seus elementos-chave. Nesse caso, diferente do que falamos acima, é difícil criar uma generalização; por isso, pegamos um ou outro tópico que compreendemos que podem representar o todo.
Regra do pico-final: As pessoas tendem a julgar experiências com base no momento mais intenso (pico) e no final, negligenciando a duração ou outros aspectos da experiência.
Nivelamento e afilamento: Refere-se à tendência de simplificar uma história ou informação (nivelamento) e destacar certos detalhes que parecem importantes (afilamento), afetando a precisão da memória.
Efeito da desinformação: Ocorre quando informações incorretas apresentadas após um evento interferem na memória original, levando à criação de memórias distorcidas ou falsas.
Negligência da duração: As pessoas tendem a desconsiderar a duração de uma experiência ao avaliá-la, focando mais nos momentos de maior intensidade ou no final.
Efeito de recordação em série: Refere-se à tendência de se lembrar dos primeiros e últimos itens de uma lista com mais facilidade, enquanto os itens do meio são menos lembrados.
Efeito do comprimento da lista: À medida que o número de itens em uma lista aumenta, a probabilidade de lembrar de todos eles diminui, devido à sobrecarga de memória.
Efeito da modalidade: Memórias de itens apresentados oralmente são lembradas de forma diferente em comparação com itens apresentados visualmente, com impacto na retenção.
Inibição da memória: É a capacidade de suprimir informações irrelevantes ou conflitantes durante a recuperação de memórias, facilitando a recordação seletiva.
Efeito de sugestão de parte da lista: A apresentação de parte de uma lista de itens pode inibir a lembrança dos itens restantes, criando uma interferência na recuperação completa.
Efeito de primazia: A tendência de lembrar melhor os primeiros itens de uma lista, já que eles recebem mais atenção sendo processados de forma mais profunda.
Efeito de recência: Refere-se à facilidade em recordar os últimos itens de uma lista, por estarem frescos na memória de curto prazo.
Efeito de posição serial: Combinação dos efeitos de primazia e recência, descrevendo o padrão de lembrança em que itens no início e no final de uma lista são mais facilmente recordados.
Efeito de sufixo: A apresentação de um som ou palavra irrelevante após uma lista de itens pode reduzir a capacidade de lembrar o último item da lista.
CONJUNTO 4 – Por fim, guardamos nossas memórias de maneira diferente dependendo de como experienciamos as situações. Nosso cérebro salva as informações que considera relevantes em dado momento, mas também é afetado por uma série de outros fatores que muitas vezes têm pouco a ver com o valor de alguma informação – como é o caso de analisar o que também está acontecendo no momento, como a informação se apresenta e se podemos acessar isso de maneira fácil no futuro, caso precisemos. Vide a seguir:
Efeito de superioridade da imagem: As pessoas tendem a se lembrar melhor de imagens do que de palavras, pois as representações visuais são mais facilmente codificadas e recuperadas pela memória.
Efeito dos níveis de processamento: Quanto mais profundamente a informação for processada e analisada, maior a probabilidade de ser retida na memória a longo prazo.
Efeito do teste: A prática de recuperar informações por meio de testes ou exercícios aumenta significativamente a retenção e o aprendizado dessas informações.
Desatenção: Refere-se à tendência de esquecer eventos ou detalhes devido à falta de atenção durante o momento da codificação da memória.
Efeito “próximo na fila”: Pessoas têm dificuldade de lembrar informações imediatamente antes de sua vez de falar, geralmente devido à ansiedade de se prepararem para sua própria apresentação.
Fenômeno da ponta da língua: A experiência de saber que se conhece uma informação, mas não ser capaz de recuperá-la imediatamente, com a sensação de que está “na ponta da língua”.
Efeito Google: A tendência de esquecer informações que podem ser facilmente encontradas na internet, confiando no acesso rápido à informação digital. É também chamado de amnésia digital.
Efeito de auto-relevância: As pessoas lembram-se melhor de informações que se relacionam diretamente a elas ou que possuem relevância pessoal, aumentando o envolvimento cognitivo.
Chegamos ao final do nosso resumão. Você pode estar pensando “ok, e o que faço com tudo isso a partir de agora?”, mas fica tranquilo! Ainda teremos uma última parte, destinada somente a comentarmos sobre isso. Te vejo lá!
Benson, B. (2023, April 30). Cognitive bias cheat sheet. Retrieved June 22, 2024, from Medium website: https://betterhumans.pub/cognitive-bias-cheat-sheet-55a472476b18#.2ezsqki3y
Júlio Gonçalves
Psicólogo e Supervisor
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