
Conteúdo escrito por Karen Pereira
Estamos vivendo em um mundo cada vez mais competitivo, com altas demandas de produtividade, exigindo concentração e cada vez mais eficiência cognitiva. A atividade cerebral ativa pode levar ao excesso de trabalho e fadiga. Buscando entender os processos cerebrais do esforço mental prolongado, pesquisadores da Universidade Federal Báltica Immanuel Kant publicaram um estudo sobre a atividade cerebral e a percepção de informações durante tarefas cognitivas.
A pesquisa contou com 14 participantes de 18 a 22 anos, que responderam a questionários sobre o nível de fadiga antes e depois do experimento. Os cientistas utilizaram espectrografia funcional de infravermelho próximo (fNIRS) para registro da atividade hemodinâmica do cérebro e o método de registros de movimento dos olhos (eye-tracking) para análise da percepção visual, enquanto aplicavam o teste de Sternberg nos participantes durante 70 minutos.
O teste consiste em um conjunto de tarefas para estimativa da memória de trabalho, divididas em dois blocos, simples e complexo. Os cientistas mostravam quadros com um conjunto de 2 a 7 letras durante 1,5 a 2,5 segundos para os participantes memorizarem. Posteriormente, eles eram apresentados a letras e deveriam responder se elas estavam contidas no primeiro grupo de letras apresentadas. No bloco simples, era exigida a memorização de uma sequência de 2 a 3 letras, e no complexo, de 6 a 7 letras.
Os resultados apresentaram mudanças de atividade em diferentes áreas do cérebro e, apesar de o nível de fadiga dos participantes ter aumentado significativamente, isso não impactou o número de acertos. Para as tarefas simples, a fadiga levou os participantes a demorarem mais tempo para cumpri-las, porém, não houve alteração temporal na execução das tarefas complexas. A observação das atividades do cérebro mostrou enfraquecimento das conexões funcionais entre os lobos frontal e parietal do córtex cerebral no decorrer da execução das tarefas e testes de fadiga, mas, durante as tarefas complexas, os participantes que se saíram melhor apresentaram maior conectividade nessas mesmas áreas.
Os cientistas acreditam que, nas tarefas complexas, o cérebro atinge um grau de intensa atividade capaz de iniciar um mecanismo compensatório de luta que permite combater a fadiga. Para Artem Badarin, candidato a Ciências Físicas e Matemáticas e pesquisador sênior associado do Centro de Neurotecnologia e Aprendizado de Máquina da Universidade Federal Báltica Immanuel Kant, em Kaliningrado, devido aos seus recursos limitados, o cérebro precisa se otimizar para funcionar de maneira eficiente. Apesar da fadiga, as tarefas simples podem ser cumpridas com esforço mínimo, então o cérebro tende a economizar seus recursos. Já as tarefas complexas exigem maior controle de atenção e mobilização de recursos adicionais: “É por isso que, por exemplo, quando um motorista cansado chega a um cruzamento múltiplo, ele mobiliza seus recursos internos e manobra com sucesso. No entanto, em condições de condução mais simples, ele comete um erro devido à fadiga, o que leva a um acidente, por exemplo, incidentalmente dirige para uma faixa oposta ou para um acostamento.”
Apesar das limitações do número amostral e da faixa etária, e de ainda não estar claro na literatura como o mecanismo compensatório começa, funciona e influencia diferentes funções cerebrais, como a memória (objeto deste estudo), esta pesquisa destaca a adaptabilidade cerebral no gerenciamento de seus recursos limitados sob pressão, tendo implicações na resiliência mental e no aumento da produtividade sob alta demanda.
A fadiga mental reduz a conectividade entre os lobos frontal e parietal, fazendo com que tarefas simples se tornem mais lentas, enquanto as tarefas complexas desencadeiam mecanismos compensatórios de luta contra a fadiga, mantendo o desempenho.
No contexto clínico, este estudo nos ajuda a compreender um pouco mais sobre os processos psicológicos básicos do cérebro fadigado e as consequências que podem afetar as pessoas no dia a dia. Sob fadiga, o cérebro aumenta seu tempo de resposta em tarefas de baixa complexidade, enquanto o esforço compensatório mantém a eficiência da rede frontoparietal em tarefas de alta complexidade. Ou seja, em um contexto de fadiga, o cérebro atua em um nível de desadaptação a fim de guardar recursos para tarefas complexas. O processamento de tarefas simples acaba sendo lentificado, afetando a tomada de decisões e a solução de problemas, ocasionando conflitos no trânsito, em relacionamentos, no trabalho e em outros ambientes.
A adaptação cerebral nos permite continuar trabalhando concentrados sob alta demanda, sem perder a eficácia, porém, pode haver prejuízos na execução de tarefas mais simples do cotidiano.
Neuroscience News. (2024, October 25). Mental Fatigue Triggers Compensatory Brain Mechanisms – Neuroscience News. Retrieved March 1, 2025, from Neuroscience News website: https://neurosciencenews.com/mental-fatigue-brain-mechanism-27947/

Júlio Gonçalves
Psicólogo e Supervisor
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