Ela é conhecida por sua aparência gótica, fascínio pelo macabro e habilidades sobrenaturais. Acertou quem pensou em Wandinha Addams, uma personagem sombria e peculiar da família Addams. 

O mais interessante na Wandinha é que, pensando numa perspectiva psicopatológica, fica a pergunta: há sofrimento clinicamente significativo no que ela faz? Afinal, esse é um dos critérios de base de qualquer transtorno mental. Se ele não é preenchido, não há como fechar diagnóstico.

Bom, de qualquer modo, criativamente conseguimos, sim, descrever um cenário hipotético em que suas características cognitivas, emocionais, fisiológicas e comportamentais geram algum tipo de sofrimento.

Wandinha Addams, residente da mansão dos Addams, é uma jovem com interesses peculiares e um senso de humor macabro. Ela se envolve em atividades solitárias e tem dificuldade em se relacionar com os outros, mostrando um distanciamento emocional significativo. Nos últimos tempos, seu comportamento tem se tornado mais recluso, passando a maioria do tempo trancada em seu quarto. Sua família e amigos têm notado sua tristeza persistente, oscilações de humor inexplicáveis e a diminuição de sua energia.

Além disso, Wandinha desenvolveu um fascínio excessivo por elementos sombrios e sobrenaturais, envolvendo-se em práticas arriscadas, como experimentações com poções e rituais misteriosos. Esses comportamentos podem ser considerados prejudiciais e parecem estar relacionados ao seu desejo de escapar da realidade e buscar estímulos emocionais intensos.

A seguir estão características mais relevantes do funcionamento atual da Wandinha.

  • Cognitivas: desconfiança e alienação social, interpretação negativa de interações sociais.
  • Emocionais: expressão emocional limitada, falta de prazer ou interesse em atividades sociais, tendência a reprimir ou restringir emoções.
  • Fisiológicas: baixa excitação fisiológica.
  • Comportamentais: isolamento social, preferência por atividades solitárias, falta de iniciativa em buscar relacionamentos, falta de expressão afetiva.
  • Fatores Precipitantes: experiências traumáticas de rejeição, ambientes sociais hostis.
  • Fatores Manutenção: reforço parental pela preferência por atividades solitárias, evitação de interações sociais, crença de que a solidão é preferível.
  • Fatores de Proteção: apoio emocional da família.

A partir disso, vamos para a definição dos problemas numa lógica cognitiva e comportamental, assim como potencias diagnósticos.

  • Crenças Nucleares e Pressupostos: “as relações interpessoais são desagradáveis e não valem a pena”, “A solidão é preferível e mais segura do que o contato social”.
  • Hipótese Diagnóstica: Transtorno de Personalidade Esquizoide, caracterizado por um padrão duradouro de distanciamento social, desinteresse em relacionamentos íntimos e preferência por atividades solitárias.
  • Demandas/Problemas: dificuldade em estabelecer e manter relacionamentos significativos, isolamento social, falta de expressão emocional, baixa motivação para buscar ajuda.

Um aspecto super relevante na FC negligenciado pela maioria dos psicoterapeutas: as causas e predisponentes no desenvolvimento do paciente!

    • Genéticos: Possíveis transtornos de humor e de personalidade no pai e no tio.
    • História Médica: poucos problemas médicos significativos, mas possíveis lesões relacionadas a atividades solitárias arriscadas.
    • Personalidade: tendência a preferir a solidão e atividades solitárias, falta de necessidade de interação social intensa, preferência por um estilo de vida mais independente.
    • Eventos Parentais: ambientes familiares com baixa expressão emocional, falta de estímulo para desenvolver habilidades sociais, modelos de interações sociais limitados.
    • Eventos Sociais: experiências de rejeição social, falta de apoio e compreensão de pares, dificuldades em se encaixar em grupos sociais convencionais.
    • Modelo Cultural: valores sociais que enfatizam a individualidade e a independência, subculturas alternativas que valorizam a solidão e a distância emocional.
    • Principais Valores de Vida: autonomia pessoal, liberdade para explorar interesses individuais, evitar dependência emocional de outras pessoas.

Vamos às metas psicoterápicas, que devem serem construídas de forma colaborativa com o paciente, levando em consideração o nível de sofrimento, as necessidades do paciente, mudanças possíveis e esperadas, etc.

    • Metas Psicoterápicas: 1) Psicoeducação do Transtorno de Personalidade Esquizoide e impactos na vida. 2) Promover a consciência e a aceitação das emoções. 3) Desenvolver habilidades sociais e de comunicação. 4) Fortalecer relacionamentos interpessoais e estimular o engajamento em atividades sociais.
    • Obstáculos ao Tratamento: estigma social, resiliência a angústia, dificuldades de comunicação e expressão emocional.
    • Pontos Fortes e Recursos: amor e apoio da família ou amigos próximos, acesso a serviços de saúde mental, capacidade de introspecção e autorreflexão.

Eis o guia do tratamento! No caso da Wandinha, há muito o que fazer no nível de intervenção, como: estabelecimentos de objetivos de vida, vantagens e desvantagens do isolamento social, aceitação e autoestima, treino de assertividade e habilidades sociais, identidade e empatia, etc.

E aí, o que achou?

Nicoletti, E. A., Donadon, M. F. & Portela, C. (2022). Guia prático de Formulação de Caso em Terapia Cognitivo Comportamental. Porto Alegre: Sinopsys.

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Marle
1 ano atrás

As FC de personagens que você faz são fantásticas! Essa da Wandinha está imperdível! Mais didática, impossível !